19/04/2024

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Estádio do Ibirapuera pode ser demolido, ex-atletas se revoltam, e governo diz tratar-se de ‘erro de comunicação’. Entendam o fato !

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Marcelo Gomes, especial para o ESPN.com.br

Se você está acostumado com a alienação e passividade dos atletas do alto-rendimento, saiba que os ex-atletas não vêm agindo assim.

Para a nossa surpresa, encontramos, dois sábados atrás, um grupo de Masters se mobilizando contra um projeto que promete por abaixo o único estádio de atletismo da cidade de São Paulo, o lendário Ícaro de Castro Melo, no conjunto esportivo do Ibirapuera.

O evento era a 49ª edição do Campeonato Paulista de atletismo para veteranos.

E histórias de sobrevida com o esporte não faltaram.

Na prova que começou cedinho, conhecemos super-atletas dos 30 aos 90 anos em plena atividade.

Muitos quase anônimos como Djair Luiz, que já fez uma Maratona de São Paulo correndo amarrado a um pneu com mais de nove quilos, passando por seu Yoshiuki Shimizu, campeão mundial dos 100, 200, 400 metros e do salto em distância no auge dos seus 89 anos de idade; e ainda por grandes nomes do atletismo olímpico brasileiro como Conceição Geremias (61 anos) e dona Wanda dos Santos, medalhista da competição, mesmo depois de ter sofrido um AVC um anos atrás.

Conferimos de perto o sentido mais amplo de superação. Na verdade, nos meus 27 anos de jornalismo esportivo, jamais havia vista algo tão simbólico e exemplar.

Vendo de perto o desempenho dessa gente quase centenária que nunca abandonou o esporte, juro que me senti um velho, obsoleto, mesmo ainda não tendo completado os 50 anos de idade.

No nosso caminho, além de depoimentos de senhores e senhoras (atletas) que garantiram nunca terem pago um plano de saúde, constatamos como o velho e o novo são desprezados pelos órgãos que deveriam fomentar e desenvolver o esporte.

 

  • Uma luta quase em vão

 

Era para ser um momento de festa, mas a notícia que rondava os bastidores da competição causou indignação e revolta de todos os participantes.

Os comentários davam conta de que o Complexo Esportivo Constâncio Vaz Guimarães, público do Estado, seria privatizado. Pior, a pista inaugurada no início da década de 1970 seria colocada abaixo.

Tudo porque o edital prevê a concessão do espaço por 30 anos sob um pagamento de R$ 230 milhões.

Assim, o discurso de comemoração e de contemplação, ao término de cada prova, tornou-se um verdadeiro palco de lamentações e tristeza.

Dona Wanda dos Santos se dizia mais triste com a notícia da concessão e, consequentemente, da destruição da pista onde conquistou duas medalhas nas provas de arremessos: “Não é possível que em pleno século XXI ainda existam pessoas querendo acabar com e esporte, com o pouco que temos e conquistamos.”

Dona Wanda, que representou o Brasil em duas Olimpíadas na década de 1950, emenda: “Gostaria de saber quem é que foi que teve essa ideia absurda. Gostaria de ficar frente a frente com o cidadão que tomou essa decisão. Perguntaria a ele por que ele não ouviu a nossa classe, os atletas e ex-atletas?”

Essa também foi a principal questão levantada por Jefferson Hilário, ex-saltador nos anos 1990 e membro da ADAB (Associação Desportiva Atletismo Brasil). Hilário diz que no edital de concessão o governo chamou muitos homens de negócio e nenhum atleta.

“É um verdadeiro absurdo o que estão querendo fazer aqui. Além de acabar com as competições Master, irão acabar com a perspectiva dos atletas que fazem parte do Projeto Centro de Excelência que já revelou tantos ídolos do esporte brasileiro como Maurren Maggi, Jadel Gregório e Geisa Arcanjo no atletismo e Tiago Camilo no judô”, lembrou.

 

  • Outro lado

 

Indignados com a situação, muitos atletas masters que estavam ali quiseram gravar umas mensagens para o secretário de Esportes, Lazer e Juventude.

Fomos, então, ao prédio da secretaria, no centro da cidade, para ouvir o que o delegado da Polícia Federal, licenciado para o cargo, teria para falar.

Paulo Gustavo Maiurino assumia a secretaria há pouco mais de dez meses. Garante que não é filiado ao PRB, que toma conta da pasta, e que foi indicado ao cargo pelo Governador Geraldo Alckmin.

Disse que o próprio partido já rompeu com o governo por não concordar com a condução de Paulo à frente da secretaria e afirma: “É muito difícil estar aqui e conseguir fazer as coisas. Para você ter uma ideia, no dia da minha posse não havia um só Deputado do partido sequer presente. Eles querem administrar de um jeito que eu não permito e isso gera muitos conflitos, Não sei até quando continuarei por aqui.”

O depoimento do secretário Paulo só confirma o que muitos sabem e o que poucos têm coragem de declarar.

Neilton de Moura, técnico renomado que revelou muitos atletas na pista do Ibirapuera, vai de encontro a fala do secretário.

“Eu trabalhei durante 30 anos nos projetos de alto rendimento do Ibirapuera. Resolvi pedir demissão, mesmo estando próximo da minha aposentadoria. Sai de lá porque acredito que o governo do estado nunca tratou com respeito aquela pista sagrada, muito menos os atletas. O governo do estado sempre viu a secretaria de esportes como uma moeda de troca”, analisou.

 

  • Resposta aos atletas

 

O secretário Paulo Gustavo Maiurino assistiu às perguntas que levamos a ele e responde: “Houve um erro de comunicação entre o estado e a população. Não se trata de uma privatização do espaço, e sim de uma concessão por 30 anos. As pessoas têm que entender que o complexo está velho e obsoleto, além de ter um custo de R$ 11 milhões por ano e uma arrecadação que não chega à metade. Nossa proposta e dar à iniciativa privada a oportunidade de modernizar e gerar empregos no local.”

Perguntado para onde os atletas e ex-atletas irão, ele respondeu: “Nós estamos ainda analisando as possibilidades e os projetos que estão sendo apresentados nessa primeira parte do edital. Nossa proposta é de investir o dinheiro arrecadado no Centro Esportivo Mário Covas, que fica em Cotia, região metropolitana de São Paulo. Outra opção é deslocarmos os atletas e candidatos à atletas para o Centro Paralímpico, situado na rodovia dos Imigrantes.”

No final do nosso encontro, Paulo Maiurino afirmou que haverá uma série de audiências públicas onde a população e os atletas poderão participar das discussões e, principalmente, do rumo do hoje mais que complexo esportivo do Ibirapuera.

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