O 1º brasileiro de 1 milhão de dólares

 

Quando o período internacional de contratações da MLB for aberto, em 2 de julho, Eric Pardinho, a promessa de 16 anos, estará preparado para receber seu primeiro cheque de sete dígitos. Será que o arremessador novato estará à altura de seu pai vendedor?

NAS COLINAS DE IBIÚNA, acima dos eucaliptos e a cerca de 80 km a oeste do centro de São Paulo, um olheiro de grandes ligas está atrás do home plate no estádio do Centro de Treinamento Yakult em um domingo de tarde em abril. Da sombra do placar, ele aponta seu radar para o campo, no qual o arremessador Eric Pardinho, de 16 anos, está surpreendendo e superando os adolescentes normais que não tinham nada a ver com a história ao enfrentá-lo.

Próximo dali, outros avaliadores elogiam a técnica do jovem arremessador. Falam da forma como ele gira a metade inferior de seu corpo para criar o movimento de alavanca que alguém cuja altura de 1,75 m generosamente distribuída não deveria conseguir criar. Falam sobre como as suas mãos estão em uma posição perfeita quando o pé frontal pisa no chão. E sobre a continuidade do movimento. “Você assina contrato com as pessoas e trabalha com elas por três anos nas ligas menores para fazer com que façam tudo isso”, diz o olheiro.

Setembro passado, com 15 anos, Pardinho virou sensação quando lançou uma bola a 144 km/h para adultos nas eliminatórias do World Baseball Classic em Nova York. Quase um ano depois, com a janela de contratos internacionais da MLB prevista para começar em 2 de julho, espera-se que ele assine o maior contrato já oferecido a um prospecto brasileiro.

Mas nem todos estão convencidos. Alguns executivos da MLB se questionam sobre o tamanho do garoto e a falta de competitividade no Brasil, um país fanático por futebol que produziu a sua primeira grande liga apenas em 2012 e mandou um total de três jogadores para as grandes ligas.

Então, ele vale a pena? A resposta depende do poder do arremesso… do poder de convencimento, na verdade.

Nas arquibancadas, na linha da primeira base, o pai de Pardinho, Evandro, observa atentamente. Na sexta-feira, ele dirigiu 480 km para assistir o jogo do filho em um torneio de final de semana, como ele sempre costuma fazer. No sábado, ele quase infartou quando seu filho tentou aproveitar um wild pitch correndo desde a segunda base, deslizando para o home plate em uma jogada frenética na qual o arremessador passou por cima de Pardinho, evitando uma bela colisão. No domingo, mesmo sendo o jogo do título, o novo rosto do beisebol brasileiro está em situação diferente. Ao invés dos cinco ou seis entradas que Pardinho jogaria normalmente, ele jogará em apenas duas.

Com relação ao seu pai, cuja busca implacável de posicionar o seu filho nas grandes ligas fez com que Eric se tornasse o primeiro candidato brasileiro a ter um agente, tem uma abordagem cuidadosa.

“O meu maior medo é de ele se machucar”, afirma Evandro. “Quero colocá-lo em uma bolha”.

 

EVANDRO PARDINHO é um vendedor. Bisneto de imigrantes italianos, ele usa óculos e camisas de marca. Ele tem cabelo grisalho perfeitamente penteado e unhas bem cuidadas. Ele ganha a vida trabalhando com calçados infantis para uma empresa brasileira chamada Kidy.

Mas uma das jogadas de vendas mais bem-sucedidas de Evandro foi com o seu filho de seis anos. Em 2007, os Pardinhos tinham acabado de voltar de uma viagem de praia no Paraná, em que o tio japonês de Eric havia se impressionado com a coordenação dos olhos e das mãos que o seu sobrinho mostrava ao jogar frescobol numa manhã. O tio disse ao cunhado que talvez o garoto devesse tentar jogar beisebol.

De volta para casa, na cidade rural de Bastos, sabendo muito bem que Eric resistiria, Evandro enganou o filho. Ele disse que o levaria para jogar futebol, o maior amor do menino. Ao invés disso, Evandro levou Eric direto ao diamante local para que ele tivesse um encontro com o beisebol.

“Eu não sabia o que era”, afirma Eric. “Mas havia muitas crianças jogando e eu fiquei curioso. Crianças gostam de sujeira e bola, então eu me diverti muito”.

Ainda assim, a melhor parte do dia foi quando as luvas e os tacos (e os pais intrometidos) foram embora. “Depois, todos ficamos e jogamos futebol”.

Uma década depois, o vendedor de sapatos admite que precisou fazer hora-extra para tentar convencer o filho.

“No começo, houve resistência porque ele amava futebol”, afirma Evandro, um ex-jogador de vôlei que aprendeu o passatempo americano junto com o filho, até se voluntariando como treinador para o jovem time de Eric, apesar de sua falta de familiaridade com o esporte. “Mas com muita insistência, ele acabou cedendo e começou a frequentar o treino de beisebol”.

Para um pai que não sabia absolutamente nada sobre o jogo, fazer com que seu filho comprasse a ideia de beisebol poderia parecer algo estranho, até você considerar o histórico do local.

Como muitas colônias de imigrantes asiáticos no Brasil, que possui a maior população japonesa do mundo fora do Japão, Bastos permanece indelevelmente influenciado por sua ascendência. A rua principal é chamada de Avenida Dezoito de Junho, nomeada após a data de 1908, quando os imigrantes agricultores japoneses chegaram ao Brasil e rumaram para o interior, buscando trabalho nos campos de café e cana-de-açúcar. Um quarteirão à frente está um centro comunitário em que as mulheres idosas vestidas com quimonos praticam dança tradicional e as jovens estudantes aprendem a completar equações matemáticas aparentemente impossíveis em questão de segundos usando um antigo ábaco chamado soroban.

Mas talvez a coisa mais japonesa do lugar seja o seu campo de beisebol.

Nomeado oficialmente pelo homem que fundou Bastos há quase 90 anos, o Estádio de beisebol Tsutoma Maruyama esteve presente desde os primórdios da cidade e está localizado no meio dela, ao lado da igreja. Conhecido pelos locais como Campo da Cidade, ele era um templo construído pelos japoneses para homenagear o jogo que eles amavam. Durante a maior parte do século 20, foram eles que praticamente o usaram, em parte devido a uma comunidade imigrante insular que não estava interessada em se misturar com gaijins (estrangeiros) e em parte porque a maioria desses gaijins preferia futebol como seu esporte de importação, com suas estranhas regras. Mas no início dos anos 1980, quando a crise econômica do país fez com que muitos imigrantes japoneses fossem embora, o DNA do beisebol brasileiro lentamente começou a evoluir.

Em 1992, Jose Pett, um paulista de cabelos loiros, olhos azuis, e 1,98 m, foi contratado pelo Blue Jays, de Toronto, por US$ 700 mil, mais do que qualquer jogador internacional já havia recebido. Em 2000, quando o Centro de treinamento Yakult foi inaugurado em Ibiuna, seis dos 25 jogadores de sua primeira classe eram 100% brasileiros.

Quando Eric Eiji Taniguchi Pardinho foi impelido a visitar o Campo da Cidade alguns anos depois, a revolução gaijin estava bem encaminhada.

Evandro Pardinho é vendedor, e um de seus lançamentos de maior sucesso de sua vida foi seu filho – FOTO: LUIZ MAXIMIANO PARA ESPN

 
TALVEZ SEJA APENAS uma coincidência que em 2013, o ano após o nativo de Bastos, Luiz Gohara, assinou um contrato recorde com o Seattle Mariners com um valor de quase US$ 1 milhão, o filho de 12 anos de Evandro Pardinho finalmente desistiu do futebol e começou a focar em beisebol. Por outro lado, um vendedor trabalha com comissão.

Um ano depois, em 2014, Evandro mandou seu filho para morar sozinho no Centro de treinamento Yakult, no qual Gohara já treinou e no qual Eric se tornaria o residente mais jovem na que é essencialmente o correspondente do beisebol brasileiro para a Academia IMG. Além de trazer sua luva e chuteiras, Eric trouxe uma lista de tarefas desafiadoras.

“Para Eric alcançar o sucesso que ele está construindo no Brasil e no mundo, tivemos de criar metas para ele”, afirma Evandro, observando que quando o seu filho chegou ao centro de treinamento a velocidade de seu arremesso estava abaixo de 112 km/h, o que era bom para um menino de 13 anos, mas não era bom o suficiente. “Nós tínhamos uma meta de que em um ano, ele chegaria a 130 km/hora. Ele conseguiu alcançar 130 km aos 14 anos e quando ele completou 15 anos, a meta era alcançar 145 km/hora. Era um enorme passo ir de 130 a 145 em um ano, e depois dos 145, ele criou outras metas, para alcançar 148, 151 até chegar em 152”.

Era um salto tão drástico na velocidade, especialmente para um menino como menos que 1,70 m de altura, que aqueles que conheciam Eric ficaram preocupados se o seu corpo aguentaria o ritmo.

“Me preocupa bastante”, afirma Mitsuyoshi Sato, um gentil senhor de 71 anos que tem sido o treinador principal na academia de treinamento Yakult desde sua inauguração e responde exclusivamente ao apelido Sensei. “Isso é raro no mundo do beisebol. Então temos um cuidado especial para evitar lesões, especialmente em seu braço. Estamos felizes, mas ao mesmo tempo, preocupados com isso. Como esse menino pode arremessar com uma velocidade tão alta?”

O segredo, em parte, pode ser encontrado na instrução com influências asiáticas de Eric.

“Usamos a técnica japonesa nele”, afirma Arthur Assanome, que passou os últimos 30 anos treinando crianças em Bastos, incluindo Gohara, que foi negociado para os Atlanta Braves em janeiro. Diferente de Gohara, um robusto canhoto com 1,90 m que é comparado a CC Sabathia, Pardinho não é muito alto. Mas o que lhe falta em magnitude, ele compensa em mecânica.

“O potencial e a união de todas as forças”, afirma Assanome, referindo-se à ênfase japonesa da energia cinética e transferência de peso. “Em pouquíssimo tempo, ele conseguiu assimilar todo o ensinamento e começou a usar o seu corpo da maneira correta. Ele construiu massa, precisão e velocidade”.

Ele também construiu um currículo muito sólido.

Com 14 anos, Pardinho arremessou três vezes no Campeonato Pan-Americano sub-14 na Venezuela e levou três troféus para casa (o maior número de vitórias, maior número de strikes e menor ERA). No verão passado, no Campeonato Pan-Americano sub-16 de 2016, ele marcou 12 strikes em seis entradas que levaram à vitória do Brasil sobre a República Dominicana.

Dois meses depois, no classificatório do WBC no Brooklyn, ele teve a sua estreia, jogando dois terços de uma entrada contra o Paquistão e lançando uma bola rápida que foi marcada a 150 km/hora. Não foi nem de longe uma estreia perfeita (ele cedeu um walk, permitiu uma rebatida e não terminou a entrada), mas para um jovem de 15 anos de um país que está apenas começando chamar a atenção dos observadores, era mais do que suficiente. Pardinho se viu no centro de um frenesi.

Os Mariners, Blue Jays e Arizona Diamondbacks demonstraram interesse. Também o fizeram New York Mets, Cincinnati Reds e Tampa Bay Rays. A atenção foi tanta que em janeiro, o vendedor de sapatos do campo da cidade contratou um representante de atletas de Los Angeles (o agente Rafa Nieves, agora de Wasserman com base em L.A.) para lidar com as negociações de Eric. Logo depois disso, o pai e o filho embarcaram em uma turnê de demonstrações, exames médicos e jantares. Havia um armário com o nome de Pardinho, e sua famosa camisa nº 43 pendurada nele, e a grama tão perfeitamente verde que Evandro teve de tocá-la para se certificar de que era real.

Mais recentemente, Eric ficou com a posição nº 5 da MLB.com de candidatos internacionais e o único arremessador a ficar entre os 25 primeiros. Quando o período de contratação internacional começar, espera-se que ele assine um contrato no mesmo dia com um valor entre US$ 1 e US$ 2 milhões, muito acima dos US$ 880.000,00 recebidos por Luiz Gohara há cinco anos.

Em termos de beisebol, um milhão e meio de dólares por um talento internacional pode não parecer muito, não se for comparado aos US$ 42 milhões pagos ao cubano Yasiel Puig pelo Dodgers em 2012, ou os US$ 31,5 milhões do compatriota Puig, Yoan Moncada, pagos pelo Red Sox em 2015. Ou mesmo pelos US$ 6 milhões que o Giants pagou pelo jogador de Bahamas Lucius Fox naquele mesmo ano, um recorde para um jogador não cubano.

Em outras palavras, a venda esperada de Pardinho é inédita para um candidato brasileiro. Para tornar o pagamento ainda mais conspícuo, agora há o novo acordo de negociação coletivo que entrou em vigor em dezembro passado, o que limita o quanto os clubes da MLB podem gastar em contratações internacionais, impondo um rígido limite entre US$ 4,75 e US$ 5,75 milhões. (No antigo acordo trabalhista, os times podiam gastar o quanto quisessem, contanto que pagassem uma “taxa de luxo” por superar o valor alocado). Em outras palavras, relativamente falando, um milhão e meio de dólares é muito dinheiro.

“Nós simplesmente não podemos competir com essa quantia obscena dinheiro e não há nenhuma razão pela qual deveríamos”, afirma um executivo da Liga Americana, que compara o nível de talento de Pardinho com uma escolha de uma terceira ou quinta rodada no ensino médio nos EUA, o tipo que tipicamente assina com qualquer valor de US$ 500.000,00 a US$ 800.000,00. “Você pode ter o mesmo jogador nos Estados Unidos por um valor muito menor. Não precisamos pagar um intérprete, você conhece seus adversários e pôde avaliá-lo com relação a uma boa competição”.

“Você consegue um arremessador muito mais barato na República Dominicana e na Venezuela”, disse um segundo dirigente da Liga Americana da MLB.

O que gera a pergunta: Por que tanto alvoroço pelo menino de Bastos?

Diferente de Gohara ou qualquer candidato brasileiro antes dele, Pardinho tem um agente. Dois, se contar o seu pai. “O seu pessoal fez um bom trabalho o promovendo”, o segundo executivo afirma. “Se Gohara tivesse feito o circuito de demonstrações e tudo mais, ele teria ganho muito mais”.

Ao invés dele, é Pardinho quem deve fazer história. E muito dinheiro.

O seu pai parece tranquilo com os dois.

“As pessoas ficavam me dizendo que Eric só era bom aqui no Brasil e que no exterior havia muitos como ele”, afirma Evandro, no modo de vendas perpetuamente ativado. “Eu sempre fui um atleta e sempre quis ser o melhor em tudo que fazia. Então essa se tornou a nossa meta, minha e dele. Nós trabalhamos e conversamos para que ele mostrasse para o mundo que sim, o Brasil também pode ter grandes jogadores de beisebol. Em julho, quando ele puder assinar com um grande time americano, nós terminaremos uma história que começou quando ele tinha seis anos. Nós iremos encerrar este capítulo e abrir um novo: chegar nas grandes ligas.

 

O beisebol no Brasil continua fortemente influenciado pela ascendência japonesa, visto pelos caracteres no rolo compressor em um campo em São Paulo. – FOTO: LUIZ MAXIMIANO PARA ESPN

 
DE VOLTA ÀS COLINAS DE IBIÚNA, acima dos eucaliptos, o olheiro está na sombra do placar com seu radar apontado para os lançamentos dos arremessadores.

Mesmo sendo a final da importante Mariners Cup, Pardinho não está começando nem fazendo seus costumeiros 70 ou 75 arremessos. Hoje ele é um arremessador limitado a 30 lançamentos. O dia 2 de julho está chegando e, bem, melhor prevenir do que remediar.

No começo da semana, durante um jogo entre o time no centro de treinamento, Pardinho não participou por causa de uma dor no ombro. Mas cinco dias depois, com radares de olheiros e olhos internacionais sobre ele, ele começou a sexta entrada do jogo do título com o Nippon Blue Jays, que perde por 6 a 0 para o Marília, a potência que venceu tudo ano passado.

“Os únicos dois rebatedores que me interessam são Watanabe e Coutinho”, diz um dos olheiros, sugerindo que Pardinho, por ser um homem entre meninos, não tem competição nenhuma. Aparecer entre dois candidatos que podem realmente assinar com equipes da MLB, no entanto, é uma história diferente.

Na sexta entrada, Pardinho eliminou Vitor Watanabe com strikes, um menino japonês pequeno e nervoso que está entre os melhores jogadores do país. Depois de cuidar de Watanabe, ele lança uma bola com 150 km/hora para Victor Coutinho, um jogador canhoto alto, de ombros largos e moreno com um moicano castanho escuro que é praticamente o modelo perfeito da revolução gaijin. Coutinho, que é indiscutivelmente o melhor batedor amador que o Brasil tem a oferecer, aceita o lançamento de Pardinho e rebate a bola para o centro, e a bola teria limpado o diamante não fosse pelas dimensões cavernosas do campo. Ao invés disso, ela pousa sobre a cabeça do defensor central, a cerca de 120 metros de distância, para uma rebatida dupla. O som retumbante do taco de Coutinho serve como um lembrete sóbrio de que, para todo o exagero que envolve Pardinho, existem sinais de alerta.

 

Aos 16 anos, Pardinho é apontado como um jogador que pode fazer história – e ganhar entre US$ 1 e US$ 2 milhões – FOTO: LUIZ MAXIMIANO PARA ESPN

 
Primeiro, há toda uma questão sobre o nível de competição. Enquanto a chegada de brasileiros trouxe mais atletas para o jogo, o declínio dos jogadores japoneses, devido à migração reversa e famílias de terceira e quarta gerações dando mais importância à educação que ao esporte, resultou em um caminho esburacado para o beisebol. Na rodada inicial da Mariners Cup no sábado, os dois primeiros jogos terminaram com um erros. Na decisão de domingo, a ação é interrompida por 10 minutos, quando um catcher acertou, acidentalmente, seu arremessador no joelho com um lance enquanto tentava eliminar um corredor roubando a segunda base.

“Eu gostaria de dizer que melhorou”, afirma um dos olheiros da Liga Americana sobre o beisebol brasileiro, “mas, para mim, piorou um pouco nos últimos anos”.

Mesmo Pardinho sendo a exceção, mesmo que normalmente ele faça as coisas do jeito certo, há preocupações sobre o que acontecerá se ele começar a fazer as coisas do jeito errado.

“Sempre que eu mando alguém do Brasil para os EUA, eu aviso à diretoria que ele vai ter dificuldade”, afirma o olheiro da Liga Nacional que cresceu no Brasil e que depois se tornou um arremessador universitário nos Estados Unidos. “Aqui, os rebatedores que têm dificuldade na primeira oportunidade no bastão vão ter dificuldade no jogo inteiro, porque eles não fazem mudanças. Nos EUA, a segunda vez é algo completamente diferente. Quando Pardinho estiver na Double-A, ele será apenas mais um jogando uma bola de curva a 150 km/hora. Ele precisa melhorar, mas e se ele não conseguir? E se sua dificuldade for tamanha que ele não queira mais jogar?”

Com esse tipo de processo de adaptação, é fácil ver por que alguns informantes achavam que o Mariners e o Diamondbacks podiam ter as melhores chances de contratar Pardinho. Além de assinar um total de cinco candidatos brasileiros nesta década, ambos os clubes empregam olheiros brasileiros locais. Isso é uma raridade entre os times da MLB e algo que o Blue Jays, que espera contratar Pardinho, não faz. Isso sem falar que Toronto não tem nenhuma conexão brasileira.

O catcher do Indians, Yan Gomes, assinou com o Blue Jays em 2009 e estreou com ele três anos depois, tornando-se o primeiro jogador brasileiro nas grandes ligas (o arremessador Andre Rienzo e o outfielder Paulo Orlando foram os seguintes). Muito antes disso, em 1992, o Jays foi o primeiro time da MLB a testar o mercado brasileiro quando ele contratou Jose Pett, o grande gaijin. A notícia foi tão importante no país de Pett que o time do clube mudou de nome e se tornou o Nippon Blue Jays, completo com um uniforme autêntico que Toronto doou após o pedido de Pett.

Um quarto de século depois, Eric Pardinho usa esse mesmo uniforme e está preparado para seguir os passos de Pett. Bem, alguns deles, pelo menos.

Por mais promissor que Pett fosse, ele estava essencialmente fora do beisebol aos 22 anos, vítima de uma tentativa de transição que tornou ficou ainda mais difícil com o abuso de álcool, de acordo com aqueles que conhecem sua história. “Ele tinha todos os componentes físicos”, afirma um antigo olheiro, “mas sua cabeça era fraca, a história era outra”.

No total oposto, o tão desafiado Pardinho (que de alguma forma conseguiu manter a compostura no palco do WBC) recebe elogios pela sua postura mental. “Fora de série”, afirmou um olheiro.

“Muitos jogadores no time nacional ficam nervosos, mas eu não me preocupo”, afirmou Pardinho, que é convencido ao ponto de usar um brinco e se balançar no deque com o seu capacete ao seu lado, no chão, expondo seus cachos negros dignos de uma boy band para todos verem. “Eu jogo essas partidas como se não houvesse outros jogos aqui no Brasil”.

Ele confessa que se sentiu um pouco inseguro no Brooklyn no outono passado. “O Classic era diferente… eu me senti um pouco nervoso no começo. Mas depois eu me acostumei”.

Exatamente da mesma maneira que os avaliadores se acostumaram aos seus intangíveis.

“O seu conhecimento sobre beisebol, seu desejo de ser bem-sucedido é o maior equalizador”, afirma o olheiro. “É aí que você acrescenta cinco centímetros à sua altura”.

 

“Usamos a técnica japonesa nele”, disse Arthur Assanome, que passou os últimos 30 anos treinando crianças em Bastos – FOTO: LUIZ MAXIMIANO PARA ESPN

 
IMEDIATAMENTE DEPOIS DAS finais da Mariners Cup, jogadores de ambos os times ficaram lado a lado nas linhas de fundo, encarando o diamante sem os seus bonés. Em uníssono, eles se curvaram e disseram “arigato” ao campo deserto. Então eles se voltaram para os seus treinadores, se curvaram novamente e os agradeceram. Finalmente eles foram até as arquibancadas entre os dois bancos de reservas e repetiram o gesto mais uma vez em direção à multidão.

Apesar de sua contínua renovação (exatamente metade dos jogadores no jogo do campeonato são gaijins), o beisebol brasileiro permanece inextricavelmente ligado às suas origens asiáticas. Mas a entrada de jogadores não japoneses está ajudando a colocar o Brasil no mapa do beisebol.

Gomes, Rienzo e Orlando são todos brasileiros. O mesmo vale para Gohara e o candidato do Twins Leonardo Reginatto, os dois jogadores com maior probabilidade de se destacar.

“No beisebol”, afirma um executivo da AL, “o atleta em si é o que estamos procurando”.

E é no Brasil que eles estão começando a procurar.

Em 2007, o Mariners começou a patrocinar seu torneio homônimo como forma de aumentar a consciência da marca no Brasil. (A julgar pelos contratos recentemente assinados de Seattle, está funcionando). Em 2011, a Major League Baseball, sempre empenhada em transformar seu produto em passatempo internacional, iniciou uma parceria informal com o Centro de treinamento Yakult investindo um valor de seis dígitos no programa por ano sob a forma de desenvolvimento de equipamentos e treinamento.

No ano seguinte, sob a direção do gerente e integrante do Hall da fama Barry Larkin, o time Brasil passou invicto por seu grupo das eliminatórias, incluindo uma vitória por 1-0 sobre o país anfitrião e amplamente favorito, Panamá, para avançar para o seu primeiro WBC. Mesmo que o Brasil não tenha sido bem-sucedido na eliminatória do Brooklyn, uma participação eletrizante de um certo arremessador de 15 anos gerou muito burburinho.

Quatro meses depois, em janeiro, Rob Manfred & Co. aumentou sua aposta em Ibiuna, formando uma parceria oficial com o centro de treinamento para criar a MLB Brasil Elite Developmental Academy. Logo depois, Pardinho (com agente e tudo) saiu em turnê de demonstração. Talvez o momento fosse uma coincidência. Ou talvez não.

“A MBL está apostando no mercado de atletas brasileiros”, afirma Sato.

O avanço do Brasil não é nada se levar em consideração o quão imenso é o país e que a Venezuela, uma nação com quase um décimo do tamanho do vizinho, produziu um pouco mais de 360 jogadores de grandes ligas até o momento. Mas você precisa começar em algum lugar. Colômbia, outro país sul-americano vizinho do Brasil, rendeu apenas sete grandes ligas no século 20, mas forneceu uma dúzia a mais na última década. Apesar da Venezuela produzir jogadores desde 1939, mais de um quarto de suas grandes ligas chegaram apenas nos últimos cinco anos.

Claramente há algo a ser dito por ora. Pergunte a Jorge Otsuka.

No dia seguinte à Mariners Cup, o presidente da Federação brasileira de beisebol e softball se senta em seu escritório de São Paulo, um pequeno quarto no segundo andar de uma agência de seguros que ele costumava gerenciar antes de se aposentar, e fala sobre o estado do esporte que ele ama quase tanto quanto seus quatro netos; sobre os desafios de fazer crescer um jogo que não obteve o amor do governo federal porque não foi um esporte olímpico (o beisebol foi visto pela última vez nos jogos olímpicos de 2008, em Pequim); sobre como é lamentável que em todo o país existam apenas cerca de 100 diamantes, e nenhum deles possui iluminação artificial; sobre como, apesar de haver mais brasileiros do que nunca migrando para o jogo, o número total de jogadores federados caiu de 6.000 há algumas décadas para 3.000 hoje, devido ao êxodo japonês.

“Estamos um pouco preocupados”, afirma Otsuka, o único presidente que a federação conheceu em seus 17 anos de história. “Porque o lado técnico do beisebol brasileiro tem crescido bastante, mas o número de atletas não está aumentando”.

Mas ainda há muitos motivos para ser otimista. Há a parceria com a MLB, um acordo que fornece a ajuda necessária no treinamento. O objetivo do beisebol é retornar às Olimpíadas em 2020, trazendo consigo a esperança de aumentar o apoio governamental. E com o crescente canalizador de grandes ligas do país, tem gente se perguntando se o Brasil pode se tornar a próxima grande fronteira do beisebol.

“Eu acho que vai continuar crescendo”, afirma Paulo Orlando, o mais recente jogador brasileiro a chegar nas grandes ligas. “Mais brasileiros querem jogar beisebol agora. Eles querem ser contratados. Querem ter a chance de mudar a vida de sua família”. Com um movimento de uma caneta, Eric Pardinho logo fará exatamente isso.

“Ele está praticamente contratado pelo Toronto, certo?” Otsuka afirma. “Toronto Blue Jays”.

É uma versão decididamente diferente do futuro que seus pais imaginaram. “Nós achávamos que ele se tornaria um médico”, afirma Evandro, cujo filho irá abandonar a escola aos 16 anos. “É difícil… mas o contrato irá facilitar as coisas”.

Eric acrescenta: “Será diferente. Uma nova vida e um novo começo”.

Não só para ele, mas para sua família e seu país.

“Ele é muito importante para o beisebol brasileiro”, afirma Otsuka. “Mas como a maioria dos atletas, ele precisa ter cuidado para não deixar o sucesso subir à cabeça, senão…”

Otsuka faz uma pausa e retoma sua linha de pensamento.

“… Você já conheceu o pai dele?”