26/07/2024

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St-Pierre revela que negociou luta com Anderson e que, se voltar, acerto ainda é possível: ‘Que seja justa’

13 min read

or Thiago Cara, do ESPN.com.br.UFC.

Afastado dos octógonos desde novembro de 2013, Georges St-Pierre entende que agora pode dizer o que não podia quando ainda era lutador do UFC. Em entrevista exclusiva ao ESPN.com.br, por exemplo, o canadense não deixou de opinar sobre as falhas na atual política antidoping do MMA ou de contar como era sua relação com Dana White, chefão da organização pela qual foi campeão durante seis anos.

Mas se engana quem pensa que St-Pierre está aposentado. No Brasil para promover um de seus patrocinadores, o ex-detentor do cinturão dos meio-médios prefere chamar a decisão tomada após o UFC 167, pouco depois da polêmica luta contra Johny Hendricks, de “pausa”, mas deixou transparecer que a possibilidade de voltar a lutar é real, desde que sejam respeitadas certas condições – ainda que não as revele.

Sobre uma eventual superluta com Anderson Silva, o lutador não fugiu. St-Pierre revelou que, no passado, o duelo com o brasileiro chegou a ser negociado de fato, mas a balança acabou impedindo que a luta saísse do papel. Para não deixar dúvidas, o canadense disse isso em bom português, idioma que arriscou também para dizer que quer voltar ao Brasil em junho, para acompanhar a Copa do Mundo.

Leia, na íntegra, a entrevista com Georges St-Pierre:

Reprodução

St-Pierre esteve no Brasil para promover patrocinador
St-Pierre esteve no Brasil para promover patrocinador

ESPN.com.br: Como é a vida de um lutador aposentado?
GSP: 
Minha vida vai muito bem. Me sinto melhor, sem estresse, durmo melhor. Até ganhei massa muscular. Treino todos os dias, mas por diversão, não para competir, o que é diferente, então, não tem o estresse. Me sinto mais saudável.

É uma vida melhor do que a de um lutador do UFC?
Sim, uma vida melhor. Um estilo de vida mais saudável. Mas ainda treino duro.

Isso significa que você não pensa em voltar a lutar profissionalmente?
Eu não sei se vou voltar. Isso depende de muitas coisas, mas preciso tirar este tempo, sem estar exposto ao estresse de competição, às críticas, à expectativa… Estava ficando louco. Precisei sair, antes que ficasse louco mesmo.

Então, você não sente falta do UFC. Mas crê que o UFC sente sua falta?
Não acredito que o UFC precise de mim. Eles são uma marca global. Se eu voltar algum dia, vai ser uma escolha minha. Ninguém nunca me obrigou a lutar, sempre fiz isso porque quis. Nunca fui vítima, e é o mesmo sobre quando decidi parar. Não fui vítima. Decidi parar porque quis e não me arrependo. Estou muito feliz. Não vou chamar isso de aposentadoria, porque não sei o que vou fazer. Eu não direi que estou aposentado, ou não, porque não sei. Chamo de pausa.

O estresse é, então, o principal motivo por trás de sua decisão?
Muito estresse. Mas estive estressado por muitas razões no esporte. Vi muitas coisas, muitas coisas passando na minha vida. Então, para mim, era hora. Quando você é um campeão por tanto tempo, você tem muita pressão. Precisei sair.

Essa pressão vinha de Dana White também, certo? Quando você parou, ele disse que você não poderia fazer isso, porque “devia ao UFC”. Você concorda?
Não concordo. Sou meu próprio chefe agora. Posso fazer o que quero agora, conquistei isso. Por causa do UFC, ganhei muito dinheiro, a exposição, os patrocinadores. Claro, o UFC é um negócio. Eu não poderia deixá-los saber o que ia fazer, mas não devo nada a eles, porque é um negócio. Eu luto, sou pago por isso e tento fazer o melhor que posso. Eu não fiquei bravo com Dana White, ele é um promotor e é seu trabalho criar “barulho” para uma revanche (com Hendricks). É o que ele tenta fazer. Acho que Dana White é o melhor promotor entre todos os esportes, ele atrai as pessoas. Mas, como qualquer outro promotor, não liga se as pessoas gostam do que ele fala ou odeiam. A única coisa que importa é que as pessoas vejam e falem (sobre o UFC). E ele é muito bom nisso. Acredito que o UFC não estaria no patamar que está hoje se não fosse por Dana White. Ele fez o UFC ser tão grande. Por isso, não estou bravo com ele. Não é pessoal, é uma visão de negócio.

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Elogioso, Georges St-Pierre falou sobre sua relação com Dana White, chefão do UFC
Sem crise: para St-Pierre, Dana White é o melhor promotor ‘peso por peso’ do mundo

Você e ele sempre tiveram boa relação?
Sim, sempre fui muito amigo de todos no UFC. Vejo o UFC como minha família. Nunca quis prejudicar o UFC, fazer algo ruim ao UFC, minha intenção sempre foi ajudar o UFC, para que a marca crescesse. Eu faço parte do UFC, é parte da minha marca também, e quero elevar a marca ao mais alto nível.

E você ainda se sente parte do UFC?
Sim, ainda me sinto parte do UFC. Nunca quis prejudicar o UFC, nunca quis prejudicar qualquer pessoa com o que disse sobre os testes antidoping, nunca quis fazer nada negativo. Não queria ir atrás de uma pessoa apenas, porque, se vou atrás de um indivíduo, 20 outros virão. Não quero ir atrás do UFC, não é minha intenção, eu quero elevar o UFC e, realmente, acredito que esse (os testes antidoping) é o próximo passo, como em qualquer esporte, futebol, beisebol, qualquer outro esporte… Atletismo…

Depois do UFC 167, o relacionamento entre você e Dana é o mesmo?
Sim, não tenho problema com Dana, não é pessoal, é um negócio. Ele é um promotor, o que ele disse, acredito, foi para fazer barulho. Conversamos depois, estava tudo bem. Ele tem sua liberdade, eu tenho a minha. Se não acreditasse que ganhei aquela luta, eu entregaria o cinturão. Fiz isso em minha primeira luta profissional, em uma interrupção “estranha”, em luta contra Ivan Menjivar no Canadá, e eu disse que não acreditava que tinha ganhado aquela luta. Disse publicamente. Assisti aquela luta muitas vezes (contra Hendricks), e acredito que ganhei os rounds 1, 3 e 5 para vencer a luta. É que o primeiro foi muito apertado, então entendo que a decisão tenha sido apertada. Mas, no meu coração, estou tranquilo sobre isso. Então é o que importa. Estou muito bem.

Você disse que Dana tem interesses que, nem sempre, são os mesmos dos atletas. Você acredita que o jeito com que ele fala com a imprensa ou sua personalidade, possa ser um problema para alguns lutadores?
O trabalho dele, você tem que entender, é fazer barulho. Não importa se as pessoas gostam ou odeiam, o importante é falarem sobre. Não existe publicidade negativa. Você cria o barulho. E ele está fazendo um trabalho incrível com isso. Acredito que ele é o melhor nisso. O melhor de todos. O melhor promotor peso por peso. Se eu tivesse um evento, em qualquer esporte, gostaria de ter Dana White do meu lado.

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Por ora, St-Pierre curte ser 'seu próprio chefe'
Por ora, St-Pierre curte ser ‘seu próprio chefe’

Então não é um problema para os lutadores?
É um negócio. Você não pode levar para o lado pessoal, e eu não levei para o lado pessoal. Você tem que separar a pessoa e o negócio. Quando é hora de falar de negócios, sou um homem de negócios, para negociar. Quando é pessoal, sou pessoal. Para mim, o MMA é um trabalho, como é com um jogador de futebol ou de beisebol. Quando trabalho, quando lido com meus negócios, sou negócio; quando é pessoal, é pessoal. Acredito que Dana White é uma boa pessoa, é um cara legal, já o vi dando dinheiro para lutadores para ajudar. É uma boa pessoa, mas quando é sobre negócios, ele é negócio. Você precisa fazer essa diferenciação.

Em suas últimas entrevistas, você se mostrou bastante ligado com o que tem acontecido no mundo das lutas, falando com propriedade e preocupação sobre o futuro do esporte, como no caso dos exames antidoping. Você se vê como um novo Dana White?
Não, não… Sobre o que eu disse é que, se eu voltar a lutar um dia, eu quero que… Não ligo para o que os outros pensam, porque elas têm opiniões diferentes, mas eu quero que minha luta seja limpa. Com um teste aleatório. Como tentei fazer em minha última luta. Devia ter feito aquilo há muito tempo. Não fiz, mas devia. É a minha opinião, não é para prejudicar o UFC, prejudicar uma pessoa, mas sim elevar o esporte. Ainda não é assim, é um esporte novo… Mas falei agora com Chris ‘Macca’ McCormack (campeão mundial do Ironman), um triatleta, um campeão, e ele pode ser testado a qualquer dia. Ele preenche um formulário, dizendo onde está e pode ser testado a qualquer hora. É assim que deveria ser. Porque há um grande problema no esporte com as drogas. Agora eles baniram o TRT, mas isso devia ter sido feito há muito tempo. O MMA era o único esporte que permitia o TRT. Não fazia sentido. E não é só o TRT o problema, é um problema grande no esporte. E não é para atacar o UFC ou alguém, quero atacar o sistema. Acredito que, para elevar o esporte, temos que fazer como meu amigo McCormack: preencher um formulário e estar pronto para ser testado. Seria justo com todos, porque quando você luta com alguém… É como uma arma. Se dou a um lutador uma faca, ele tem uma vantagem. Esteroides são como uma arma, como comprar uma arma. Ficamos mais fortes, mais agressivos, tudo. Faz muita diferença. No ciclismo, eles estão com medo de se doparem agora. O cara que terminou em primeiro esse ano, seria o 40º há dez anos. Faz muita diferença. Se algum dia eu voltar a lutar, isso seria uma condição. E quando tornei isso público, muitas pessoas me agradeceram pelo que estava fazendo. Porque muitos caras não têm meu status, o dinheiro. Não poderia fazer esses comentários no passado, porque não tinha dinheiro, teria medo. Não preciso lutar mais, já sou conhecido, estou feliz. Por causa do UFC, ganhei muito dinheiro, estou saudável. Então posso dizer a verdade sobre o que acredito e sustento isso… Então, muitas pessoas, quando fiz esses comentários, lutadores, repórteres disseram que tinham medo de dizer isso. Eles me mandaram mensagens dizendo: ‘Obrigado pelo que você está fazendo, por dizer a verdade, por fazer isso’. E acho que muita gente honesta merece isso. Eu fui acusado no passado, e a única fez que fui testado foi porque paguei por isso. Não faz sentido.

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St-Pierra acredita na volta de Anderson Silva. Superluta? 'Talvez'
St-Pierre crê em volta de Anderson Silva. Superluta? ‘Se for justa…’

Você disse que não podia dizer isso antes…
Sim, porque não tinha o dinheiro…

Mas você acredita que agora você pode ser um cara capaz de discutir isso como negócio? Você e Dana sentarem para falar sobre negócios?
Eu não sou tanto um cara de negócios. Não é minha base. Eu tenho boas pessoas de negócios para tomarem conta de mim. Meu empresário, meu advogado, eles tomam conta de mim. Eu sou atleta. Eu tenho apenas 32 anos, estou na melhor forma da minha vida. Amo meu esporte. Amo o MMA. Mas agora… Se algum dia eu voltar, tenho algumas condições, que são essas, mas eu amo (o esporte). Não me aposentei porque estou acabado fisicamente. Não dei uma pausa porque estava acabado fisicamente. Dei uma pausa porque, mentalmente, muita coisa estava acontecendo, estava vendo muitas coisas e quis tirar um tempo. Estava muito estressado.

Como estamos no Brasil, temos que falar de Anderson Silva. Você acredita que ele volta na mesma forma que o tornou um dos melhores de todos os tempos?
(Responde em português) Eu “pensar” que, antes de Anderson perder sua primeira luta contra Chris Weidman, eu “pensar” que Anderson Silva é o número 1, o melhor peso por peso do mundo. Agora, ele tem uma lesão na perna, mas eu “pensar” que ele vai voltar. Anderson Silva é um campeão, ele tem um coração de campeão. E quando alguém é um campeão uma vez, vai ser um campeão por muito tempo.

Se te ligassem amanhã e lhe oferecessem uma luta com Anderson, como uma despedida para os dois, o que responderia?
Eu não tenho medo de lutar contra ninguém. Luto contra alguém de qualquer peso, mas a luta tem que ser justa, tem que ter certas condições. Anderson Silva é um cara muito grande, muito maior que eu. Eu lutaria se fosse uma luta justa, se fosse feito do jeito certo, sob certas condições, eu lutaria contra qualquer um. Luto até contra um tiranossauro rex se ele respeitar as regras. Luto contra Brock Lesnar… Mas tem que haver regras para que a luta seja justa.

E, antes dessa pausa, as especulações sobre uma superluta sempre existiram. Houve algo além disso?
Nunca fui contra superlutas. Sou um lutador, nunca desviei de ninguém, nunca tentei evitar ninguém, mas quero uma luta justa, quero uma luta respeitando certas regras. E, se for uma luta justa, vamos fazer, sem problemas! É que são tantas coisas diferentes a serem feitas que… As pessoas falavam para eu mudar de categoria, mas eu peso 85, 86 kg e já lutei com 67 kg. Anderson Silva é mais pesado que eu. Ele pesa 100kg, 104kg… Eu não posso lutar com um homem que é mais de 10 kg mais pesado que eu. Se for justa, sem problemas! Não me importa, luto com qualquer um. Não tenho medo, nunca desviei de ninguém. Tenho medo toda vez que vou lutar, sempre tenho medo, não importa contra quem eu vou lutar, tenho medo. Mas a coragem vem do fato de você, mesmo com medo, ir e fazer. Isso é uma pessoa corajosa. As pessoas dizem ‘não tenho medo, não tenho medo’. Não é verdade. Você vai lutar, você se arrisca. Tenho medo de cada luta, toda luta tive medo, estava assustado, mas lutei, mesmo com medo. Por isso se chama coragem.

Quando você ainda estava no UFC, você negociou essa luta (com Anderson)?
Houve conversas, mas queriam que eu subisse para os médios. Se eu subir para os médios… Peso 86 kg, se eu subir de peso, o cara pesa 104 kg fora do período de luta, eu peso 86 kg fora de temporada. Agora, chego a 88, 89kg, no máximo. Meus amigos o viram (Anderson), recentemente, e ele está com 105, 106 kg. Meus amigos o conhecem. Ele é um cara muito grande. Não é uma luta justa para mim. Antes, Anderson Silva era um cara do meu tamanho, quando ele lutava no Japão. Agora, não, é muito maior. Se for uma luta justa, luto com qualquer um.

Você acredita que essas “condições justas” ainda podem aparecer, e a luta acontecer?
Sim.

Mesmo?
Sim… Também falaram de ele descer para o meu peso, quando eu era o campeão, aí não teria escolha. Se você é um peso meio-médio, eu não tenho escolha. Eu sou o campeão, vou lutar com qualquer um. Mas, eu subir, depois descer… Eu não posso brincar com meu peso. Não entendo como as pessoas podem ganhar muito peso e depois perder. Eu não posso fazer isso. Eu peso 86kg, não posso chegar a 100kg e voltar para 86kg. Eu não entendo como os lutadores podem fazer isso. Não é possível para mim. Eles são grandes atletas, mas eu não faço e não quero, é ruim para mim. Minha saúde é minha primeira prioridade.

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St-Pierre afirmou ter consciência tranquila de que venceu Johny Hendricks no UFC 167
St-Pierre afirmou ter consciência tranquila de que venceu Johny Hendricks no UFC 167

Uma luta justa como essa seria uma coisa capaz de te motivar a voltar a um octógono?
Se eu voltar um dia… Eu posso voltar e lutar pelo título ou em uma superluta, mas tem que respeitar minhas condições. É só o que peço, uma luta justa. É como eu disse, se não, é como uma arma.

Então não há uma oferta no mundo que possa lhe fazer voltar, se você não sentir que é o seu momento?
Não se trata de Anderson Silva. Sempre fui grande fã de Anderson Silva. Não olho somente para ele. Agora, ele precisa focar em sua recuperação. Tive um problema similar, com minha lesão no joelho, e ele precisa se focar na recuperação. Aí, quando estiver fisicamente bem, ele precisa focar no lado mental, porque é difícil voltar de uma lesão, porque você não se sente do mesmo jeito, mentalmente. Isso leva tempo.

Mas, nesse caso, nem falo tanto sobre Anderson Silva, quero dizer se há alguma oferta capaz de fazer você voltar a lutar...
Ah, sim… É que, por agora, preciso de um tempo. Talvez, não sei depois, se tiveram uma oferta, e eu achar boa, talvez.

Para encerrar, você está vindo para o Brasil pela segunda vez em pouco tempo. O que está achando do país?
(Responde em português) Eu vim para o Brasil cinco vezes. Três vezes para treinar, no Rio, para treinar jiu-jitsu; uma vez, por Francis Carmont, em Jaraguá do Sul; e agora com a Under Armour, para fazer propaganda para meu patrocinador.

E o que mais gostou?
A viagem para treinar. Gosto de treinar…

Conheceu o futebol?
Eu quero voltar para a Copa do Mundo. Para a Copa do Mundo e para treinar também…

E para quem você vai torcer? O Canadá não vem…
É, o Canadá não é um bom país para futebol (risos). Gosto do Brasil e da França.

E acha que o Brasil vai ganhar em casa?
Eu acho que o Brasil tem os melhores jogadores. Mas não são sempre os melhores que vencem, e, sim, os jogadores que fazem o melhor jogo. Por isso, nem sempre é o melhor lutador quem vence, é o lutador que faz a melhor luta naquela noite. Por isso, às vezes, é imprevisível…

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