Gordinha e excluída, a americana fora dos padrões em Roland Garros.
5 min read
-
- Por Felipe de Queiroz, do ESPN.com.br.
-
Getty ImagesTaylor Townsend está na terceira rodada de Roland Garros
Altas, magras e atléticas. Como passarelas de moda, as quadras de tênis constituem um cenário restrito, onde o “diferente” nem sempre é visto. O mundo fashion rejeita os quilos a mais; de forma análoga – mas por razões distintas -, no tênis competitivo, atletas fora de forma têm dificuldade extrema para triunfar.
Para toda regra, porém, existem as exceções, casos excepcionais que confirmam tendências. E pelo menos neste Roland Garros essa exceção responde pelo nome de Taylor Townsend.
Negra em um esporte de maioria branca, Townsend já estaria acostumada a ser minoria. Mais que isso, essa americana de 18 anos ainda esta acima do peso, tem a silhueta notadamente avantajada, em nada semelhante às musas e candidatas a musas que povoam o complexo de Roland Garros. Para uma atleta, está quase obesa.
Se vista “à paisana”, sem raquete e longe das bolinhas, Townsend dificilmente seria reconhecida como uma das 128 atletas que disputaram a chave principal do Grand Slam francês.
Ela não parece, mas é. É uma tenista profissional, foi uma das melhores juvenis de sua geração, campeã de Wimbledon (em simples e duplas) e do Australian Open. É esperança de sucesso do tênis feminino de seu país no futuro. Canhota, de saque potente, estilo agressivo, golpes potentes do fundo de quadra e afeita a voleios (qualidade raríssima entre as mulheres).
Bom desempenho em Roland Garros
“Tenho trabalhado muito duro. Minha vida inteira eu tenho trabalhado duro e são por momentos como esse que todo atleta trabalha e que eu tenho trabalhado”, disse Townsend, 18 anos, ao New York Times, depois de derrotar sua compatriota Vania King, naquela que foi sua primeira vitória em Grand Slams na carreira, na última segunda-feira. “Estou muito feliz e me sinto afortunada de vencer em minha primeira partida. Mas não estou satisfeita, quero continuar evoluindo”.Townsend estreou com vitória e não parou por ai. Passados dois dias, venceu de novo, desta vez a francesa Alise Cornet. Sua trajetória parou apenas na terceira roda, quando perdeu para a espanhola Carla Suarez Navarro, cabeça de chave número 14 e especialista no saibro.
A jovem americana foi uma juvenil bem sucedida, mas é “peixe fora d’água” em grandes eventos. Em toda carreira profissional, tem 93 partidas, mas quase todas em eventos menores da ITF (Federação Internacional de Tênis).
Em torneios oficiais da WTA (Associação de Tênis Feminino), sua história prévia é ainda menor, com apenas duas vitórias antes desta edição de Roland Garros, ambas em Indian Wells, torneio que disputou neste ano a convite da USTA (Associação de Tênis dos Estados Unidos).
Getty ImagesTênis é dominado por tenistas altas, magras e atléticas, como a russa Maria SharapovaO sucesso em Roland Garros pode parecer surpreendente, dado o fraco desempenho de Townsend como profissional. Por outro lado, porém, a trajetória gloriosa nos tempos de adolescentes serve como credencial para esse bom momento em Roland Garros.
Townsend, desde os tempos de juvenil, tem sempre seguido na direção oposta ao senso comum. Para bem ou para mal.Quilos a mais, dinheiro a menos
Em seus “melhores momentos”, Townsend caiu nas graças dos especialistas por seu estilo agressivo e ousado em quadra, nos piores esteve na berlinda por conta de seu ponto fraco, a dificuldade da tenista em manter-se em forma.Em setembro de 2012, quando era número 1 juvenil, os resultados de Taylor Townsend mostravam que ela estava no auge; sua silhueta, porém dizia outra coisa. Como de hábito, estava acima do peso e, por isso, viu sua carreira ser boicotada – pelo menos momentaneamente – pela USTA.
O que já era bom poderia e deveria ser muito melhor. “Como uma atleta gorda poderia estar no auge?”, indagava a USTA, que decidiu cortar todo o dinheiro de patrocínio de sua melhor atleta até que ela “entrasse em forma”.
A USTA – além do boicote financeiro – inclusive sugeriu que a tenista não disputasse o US Open juvenil naquele ano, para focar seus esforços na preparação física, mas Townsend bancou e jogou com suas próprias economias.
Getty ImagesA tenista em intervalo de partida em Roland GarrosTownsend não deixou de disputar o torneio, mas dobrou, mesmo assim, seu ritmo de treinamentos. Nada adiantou. A tenista seguiu acima do peso e em seguida veio à tona a notícia de que ela sofria de uma deficiência de ferro. Ao final do torneio, a USTA reconheceu a culpa e reembolsou a tenista.
A controvérsia não resultou no final imediato da parceria, mas o mal estar estava criado e era evidente, especialmente para a tenista, que passou a ser rotulada por estar fora de forma. Meses depois, tenista e associação romperam, mas de forma natural. Townsend se profissionalizou e, naturalmente, passou a trabalhar com sua equipe pessoal.
Hoje, a americana é treinada por dois técnicos diferentes; Kamau Murray trabalha com ela em Washington DC, enquanto a ex-tenista Zina Garrison é responsável pela preparação da jovem em Chicago.
Futuro
Townsend não é uma “Maria Sharapova”, e seu ‘rosto rechonchudo’ provavelmente não será disputado a tapas pelas grandes grifes de roupas e perfumes. Seu futuro não parece estar nas passarelas, esse terreno deve seguir restrito às “belas, magras e altas”. Seu destino, porém, pode estar no tênis competitivo, onde quer cavar seu espaço entre as “magricelas”.Até o momento, porém, a única certeza é que ela fez um bom torneio em Roland Garros.
Sobre o futuro de Taylor Townsend, aliás, não se pode aferir quase nada. Dúvidas e expectativas imperam. Será ela apenas mais um desses prospectos de craque que sucumbe ao deixar o tênis juvenil? Será ela apenas lembrada como a tenista acima do peso? Será ela – que foi a melhor juvenil americana dos últimos anos – uma nova Serena? Ou será uma nova Melanie Oudin, jovem que aos 17 anos derrotou uma série de favoritas – Sharapova inclusive – para avançar às quartas de final no US Open de 2009, mas não fez mais nada na carreira.Uma jovem talentosa, mas totalmente fora dos padrões. Por ora, essa é a definição. Seu futuro é uma incógnita. Uma coisa, porém, ninguém pode negar: ela nasceu para jogar tênis. Mesmo que tenha nascido no corpo errado.