Mais de mil jogadores declaram ‘guerra aos games’. Enteda o fato.
5 min readDiego Garcia, do ESPN.com.br.
Os apaixonados pelo jogo de videogame Fifa tiveram uma amarga decepção na semana passada. A produtora Electronic Arts anunciou o corte dos clubes brasileiros da versão 2015, em notícia que caiu como uma bomba entre os usuários do principal software de futebol do planeta. Mas o que diabos ocorreu para a EA simplesmente limar os times do país? O ESPN.com.br desvendou o mistério nesta terça-feira.
Na semana passada, uma fonte afirmou ao ESPN.com.br que os clubes, mesmo sem estarem no jogo, receberiam da EA pagamentos por participação até 2018. A reportagem, a partir daí, apurou que uma falha nos contratos entre a produtora e as agremiações não deixava claro quem pagaria os direitos de imagem dos jogadores que iam para o console Fifa. Assim, alguns atletas perceberam a lacuna e, por meio de um advogado, reivindicaram seus direitos.
Não apenas no jogo da EA, mas também com os softwares de futebol da Konami, Game Loft e da Sega, todas acionadas judicialmente por falhas nas negociações. Justamente por isso a Konami alterou seu contrato com os clubes, passando a responsabilidade pelo direito de imagem dos jogadores às agremiações, mantendo assim os brasileiros na versão 2015 do Pro Evolution Soccer.
Representados pelo advogado Leonardo Laporta, 230 procurações em nome de mais de 300 jogadores foram encaminhadas às empresas desde o fim do ano passado, e outras 740 ações chegarão nos próximos dias, de acordo com o representante jurídico responsável pelos processos. Assim, mais de mil futebolistas brasileiros devem brigar na Justiça por direitos nas participações nos consoles antigos e atuais.
“Em dezembro, notifiquei as empresas pedindo providências. Em fevereiro assinamos ajuste de conduta onde elas trariam propostas para composição de valores em cinco meses. Mas não trouxeram valor nenhum e não renovamos o compromisso de não entrar com ação, conforme estabelecemos antes. Por isso, tiraram os brasileiros do jogo”, afirmou Leonardo Laporta, em conversa com oESPN.com.br.
Paulo Baier, Aloisio Boi Bandido, Thiago Ribeiro, Jonathan (lateral ex-Santos), Felipe (goleiro), Marcelo Lomba, Leonardo Silva, Pierre, Diego Tardelli, Marcos Assunção, Dinei, Aranha, Deivid, Juan (Vitória), Lincoln, Valdomiro, Igor, Leonardo Silva, Fahel, Rafael Miranda, Roberto Tigrão, entre outros, são alguns dos clientes do advogado que move as ações relativas a direitos de imagem. A diretoria da EA na América de Norte foi pega de surpresa no fim do ano passado com os processos.
“Na notificação inicial o termo foi o seguinte: ou paguem ou tiro da prateleira. Aí conversamos, e no mês de janeiro não chegamos a acordo e assinamos um ajuste de conduta para não encerrarmos tratativas e não encerrar conversas no período. Não trouxeram proposta, e aí o que acontece? Para não tirar jogo da prateleira, com os jogos antigos sobraram ação para pedir valor indenizado do passado”, determinou Laporta.
O erro, portanto, era na negociação das produtoras com os clubes, já que alguns deles possuíam “falhas” nos contratos dos direitos de imagem dos atletas. Uma parte dos times colocava a exploração dos mesmos em álbuns de figurinhas, mas se esquecia de mencionar jogos de videogame. Com as ações na Justiça, a EA se complicou e não conseguiu resolver a tempo de lançar o console 2015. “O processo de licenciamento dos jogadores do Brasileiro sofreu mudanças”, avisou, em comunicado.
No caso de jogadores europeus, quem dá a autorização para utilização dos atletas de todos os clubes é a FIFPro, a Federação Internacional dos Jogadores Profissionais de Futebol. No Brasil, não existe qualquer coisa do tipo que possa auxiliar nas tratativas. “Nesse caso, nós discutimos direito de imagem. E isso no Brasil é irrenunciável. Portanto, necessitaria da autorização individual de cada um. A Panini, por exemplo, tira foto e paga individualmente por jogador nos álbuns”, explicou o advogado Leonardo Laporta.
“Eu tenho amplo conhecimento na área de direito esportivo das legislações italiana, espanhola, portuguesa… Todas as entidades nacionais nesses casos têm permissão legal e autorização estatutária para negociar esse direito. E isso não existe e não pode existir no Brasil, não tem como. Com base nisso a FIFPro dá autorização para jogadores do mundo inteiro, mas no Brasil, como não tem validade, notifiquei as empresas com jogos desde 2008 e até hoje, pedindo indenização do passado e providência quanto aos jogos atuais”, explicou Leonardo Laporta.
Tanto a EA quanto a Konami e as demais produtoras não tinham conhecimento sobre essa “brecha” baseada no jurídico brasileiro. Portanto, acabavam cometendo deslizes. Como no Fifa 2011, quando o Internacional pediu mais dinheiro por ser o atual campeão da Libertadores (2010) e ficou de fora. Em seu lugar, em contrapartida, entrou o colorado Porto Alegre, com exatamente os mesmo atletas do elenco do Inter, mas uniforme, nome e distintivo distintos. Nenhum dos jogadores, contudo, autorizou a participação no console.
“A Konami fala no mercado que vai lançar os jogos, só que as entidades internacionais dão autorização em nome das entidades associadas. E já ressalvo, essa autorização não se estende e não se confunde com os direitos dos jogadores. O clube autoriza a usar símbolo do clube. As produtoras não utilizam jogadores com autorização do clube, e sim com entidades de representação dos jogadores. Tanto que o Figueirense, por exemplo, uma vez saiu no jogo como Florianópolis com os jogadores reais e sem o símbolo”, concluiu o advogado Leonardo Laporta.