13/12/2024

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Óvni em jogo de futebol tornou professor de química o maior ufólogo do país. Entenda o fato.

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Não havia barulho, não havia fumaça, não havia lógica: havia apenas uma velocidade de movimento que deixou quase todo mundo embasbacado.

Adriano Wilkson Do UOL, em São Paulo.

  • Acervo Pessoal

    Ufólogo Ademar Gevaerd largou tudo para perseguir os rastros de ETs no planeta TerraUfólogo Ademar Gevaerd largou tudo para perseguir os rastros de ETs no planeta Terra

Trinta e três anos depois ainda é difícil explicar sem soar meio fora de órbita o que aconteceu no céu de Campo Grande na noite de 6 de março de 1982. Naquele sábado o Vasco tinha ido visitar o Operário pelo Campeonato Brasileiro, mas o que ficou do jogo, vencido pelo time da casa por 2 a 0, foi um vulto luminoso estranho voando acima da arquibancada do estádio.

Nas três décadas seguintes, tão numerosos quanto as estrelas no universo, surgiriam relatos de gente que olhou para cima e viu algo que eles não sabem dizer o que é.

Maria das Dores, uma torcedora fanática do time da casa, viu. Marquinhos Tavares, futuro cartola da federação de futebol local, viu. O lateral Cocada, do Operário, foi um dos que mais viram. O juiz José de Assis Aragão viu, mas não interrompeu o jogo. Alberto Pontes Filho, funcionário do estádio, também viu. O zagueiro Rondinelli, do Vasco, viu só um pouco.

Eis o que eles viram, ao se tirar o denominador comum a todos os relatos: uma luz forte, aparentemente vinda de um grande objeto que não era nem um avião, nem um helicóptero, nem nada produzido por mãos humanas, cruzando rapidamente o horizonte noturno acima do estádio Morenão.

Não havia barulho, não havia fumaça, não havia lógica: havia apenas uma velocidade de movimento que deixou quase todo mundo embasbacado.

Não houve imagens também, fotográficas ou de vídeo. Os cinegrafistas da TV Globo, que transmitia a partida, disseram que seu equipamento era muito pesado para que eles pudessem virá-lo ao céu tão rápido.

Não se sabe de alguém na arquibancada que estivesse com uma câmera fotográfica pendurada no pescoço, mas isso é altamente improvável: estamos falando do começo da década de 80.

Não há registros, mas mesmo sem registros, é possível fazer História.

A coisa voando no céu aconteceu no primeiro tempo, diz a maioria das testemunhas. No intervalo, a torcida só falava daquilo. No vestiário, os jogadores só falavam daquilo. Muitas hipóteses foram levantadas para explicar o que era aquilo, mas ninguém tinha muita certeza.

Na edição preparada no dia seguinte, o jornal “Correio do Estado”, manchetou, sem meias palavras: “Um OVNI, espetáculo na capital”. À reportagem controladores de tráfego aéreo do aeroporto local confirmavam a visão de luzes estranhas no céu. A aeronáutica confirmava que não havia voos previstos para o horário.

A ausência de uma explicação oficial fez parte da população confirmar algo que era repetido ora como drama, ora como farsa: naquela noite, Campo Grande tinha mesmo sido visitada por uma nave espacial tripulada por seres extraterrestres.

 

Reprodução

 

***

A 564 km dali, Ademar José Gevaerd estava datilografando em sua velha Olivetti e não testemunhou o fenômeno que mudaria sua vida para sempre. Ele tinha 20 anos, dava aulas de química em cursinhos de Maringá, no Paraná, tentava concluir a graduação e conservava uma paixão profunda por discos voadores.

Naquela noite, recebeu uma ligação de Campo Grande. Era seu professor de matemática, um sujeito que sempre tirava sarro da seriedade com que Gevaerd tratava seus estudos sobre a vida extraterrestre.

Do outro lado da linha, o ceticismo do professor tinha se transformado em espanto. “Você não vai acreditar no que eu acabei de ver”, disse ele. E começou a descrever os objetos voadores que tinham dançado sob o céu da sua casa enquanto ele aparava a grama do jardim.

Gevaerd ficou maluco. Não demorou até que ele se mudasse – de mala, cuia e livros de ufologia – para Campo Grande, onde entrevistaria centenas e centenas de pessoas que naquela noite viram o que, ele tem certeza, eram naves espaciais.

Foi a primeira grande pesquisa daquele que muitos consideram o maior ufólogo brasileiro. Quatro anos depois, ele fundaria a “Revista UFO”, a única no Brasil dedicada a divulgar e investigar as aventuras dos alienígenas em nosso planeta.

Desde então, o pesquisador tem sido a principal referência brasileira entre os ufólogos considerados sérios. Sua vida é quase inteiramente dedicada ao acúmulo de conhecimento sobre o que ele chama de “manifestações incontestáveis de vida inteligente alienígena”.

Gevaerd participa de congressos internacionais onde descreve os casos de avistamento de óvnis no Brasil. Ele viaja o país inteiro atrás desses relatos. Vai a programas de TV onde é sabatino por acadêmicos céticos e às vezes se vê acuado diante de evidências científicas sobre a impossibilidade de viagens interestelares.

Entra em debates acalorados com ufólogos que ele considera charlatões e já chegou a ser processo por seus desafetos. Um deles é Urandir Fernandes de Oliveira, conhecido por se dizer o porta-voz no planeta Terra do ET Bilu.

Gevaerd considera Urandir um picareta e diz que Bilu era o nome de um gato que ele, Gevaerd, tinha em Campo Grande.

Segundo ele, Urandir criou o ET Bilu só para provocá-lo. Os dois se desprezam e se ofendem em fóruns e sites de ufologia.

Gevaerd está atualmente organizando um congresso de pessoas que dizem ter sido abduzidas por ETs, pessoas que dizem ter sido levadas a planetas distantes em viagens por dentro de buracos de minhoca.

Às vezes, ele é tomado por maluco. Mas não se importa. Trinta e três anos depois do aparecimento daquelas luzes sobre os jogadores de Operário x Vasco, Gevaerd está levando a vida que pediu aos céus, estudando discos voadores, teorizando sobre civilizações de outros planetas, derrubando fraudes, produzindo conhecimento. “Eu acho que nasci para isso”, diz ele.

 

Divulgação/Revista UFO

Gevaerd analisa agroglifo em Santa Catarina; plantação teria sido base de pouso de óvni

 

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Mas existe um problema conceitual nessa história. Por definição, óvni é um “objeto voador não identificado“, mas ufólogos como Gevaerd não hesitam em identificar esses objetos como naves espaciais alienígenas.

A maioria das testemunhas do “caso Morenão” consultadas pela reportagem confirma ter visto luzes inexplicáveis dançando no céu naquela noite, mas ninguém avança a grandes conclusões sobre a origem dessas luzes.

“Eu vi um facho de luz muito rápido no céu, mas não com muita clareza como algumas outras pessoas”, afirma Rondinelli, zagueiro do Vasco naquele jogo. “O pessoal começou a dizer que era disco voador, que era chupa-cabra, mas eu não tenho condição de dizer o que era.”

Marquinhos Tavares, que tinha 14 anos na época, vai só um pouco além: “Não sei se era um disco voador, mas com certeza não era coisa conhecida no nosso planeta. Ele voava muito rápido e parava de repente, ficava ali parado no ar, e voava de novo. Nem hoje isso seria impossível, imagina naquela época!”

“Era uma luz muito, muito forte, nunca vi igual”, diz Cocada, ex-lateral do Operário. “Não posso afirmar que era um disco voador, mas não podia ser avião. Era grande, ficou uns dez segundo em cima do estádio e de repente sumiu. Foi uma coisa impressionante!”

Alguns ufólogos mais próximos do campo científico admitem que alguns fenômenos são inexplicáveis para os métodos e conhecimentos produzidos pela humanidade até hoje. Mas eles param por aí.

Ricardo Varela, que é engenheiro eletrônico, tem doutorado em computação e trabalha no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – uma espécie de Nasa brasileira – acredita que existem “indícios muito sensíveis” de que estamos sendo visitados por seres alienígenas, mas evita falar com absoluta certeza que óvnis são naves espaciais extraterrestres, dada a ausência de provas irrefutáveis.

“Alguns fenômenos já foram ligados a óvnis no passado e depois passaram a ser explicados pela física, na medida em que fomos conhecendo melhor o funcionamento da atmosfera”, diz ele. “Coisas que são inexplicáveis hoje podem vir a ser perfeitamente explicáveis em alguns anos.”

O psicólogo Leonardo Martins, doutorando na Universidade de São Paulo, fez um estudo detalhado com pessoas que dizem ter tido contato com discos voadores ou sido abduzidas. Ele chegou a duas conclusões importantes. Primeiro, elas não são loucas, ou seja, não têm sinais de distúrbios ou patologias mentais. Segundo, muitas costumam saltar às conclusões rapidamente.

“Às vezes você vê o mesmo fenômeno, mas a interpretação sobre ele varia de acordo com a bagagem cultural e trajetória de cada pessoa que o testemunhou”, ele afirma.

 

Divulgação / UFMS

Estádio Morenão, em Campo Grande, palco de Operário 2 x 0 Vasco em 1982

 

Versões

No caso do óvni do Morenão, as interpretações vão do épico ao cômico.

Gevaerd acredita que naquela noite houve uma “revoada de discos voadores no Brasil”, já que, de acordo com suas investigações, naves espaciais foram avistadas em cerca de 300 localidades em vários estados brasileiros em um intervalo de tempo muito curto.

“Tratou-se de uma civilização menos discreta que veio visitar a Terra”, diz ele.

Para os torcedores do Operário, o que aconteceu foi um sequestro do futebol local pelos extraterrestres.

O auge dos times sul-mato-grossenses no cenário nacional aconteceu em 1977, quando o Operário foi o terceiro colocado do Campeonato Brasileiro, perdendo na semifinal para o São Paulo no Morumbi lotado.

Em 1982, o time conquistaria seu único título internacional, um torneio amistoso contra o Bayer Leverkusen. A partir daí, só acumulou mais duas participações na primeira divisão do Nacional, nenhuma com grande destaque.

Nos últimos anos, tem vivido a dura realidade de rebaixamentos até no Campeonato Estadual, uma tragédia que pareceria história de outro mundo a quem se acostumou com um time campeão na década de 1970.

Enquanto isso, o estádio Morenão, que costumava lotar e ser temido no resto do Brasil, está interditado desde metade do ano passado, com problemas estruturais e sem condições de uso.

“O disco voador chegou, o futebol saiu”, diz um adágio muito comum no esporte local.

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