O curling brasileiro existe. E tentou mudar as regras para chegar a Mundial; confira.
4 min readDê Rana Do UOL, em São Paulo.
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Divulgação
Equipe brasileira de curling posa para foto durante treinamento
Relacionar a seleção brasileira de curling a qualquer tipo de referência a uma “história de cinema” pode parecer piegas, mas encontra sustentação na realidade. Afinal, foi em Vancouver (Canadá), a chamada “Hollywood do Norte”, principalmente dentro de um grupo de profissionais do mercado de animação, que surgiu uma legião de brasileiros jogadores de curling, o esporte de gelo que se popularizou no Brasil naquele torneio.
No próximo Mundial Masculino, há uma chance – remota, é verdade –, de os brasileiros terem um time nacional por quem torcerem. Afinal, os arrojados membros da recém- criada Associação Brasileira de Curling (ABCurling) desafiaram os Estados Unidos e vão jogar contra eles uma melhor de cinco jogos, no final de janeiro, para decidir quem vai ao Mundial de 2015, na Nova Escócia, extremo sudeste do Canadá.
As partidas serão em Blaine, Minnesota, em 30 e 31 de janeiro e, se necessário, 1º de janeiro. “É um paredão que temos que enfrentar”, explica Raphael Monticello, líder do grupo brasileiro. Isso porque o Brasil, hoje, só tem um jeito de disputar o Mundial: vencer os EUA, uma das cinco forças do curling. O Canadá, uma das grandes forças do esporte, ou se classifica por líder do ranking, ou garante vaga como organizador do evento (não é raro isso acontecer). Assim, a única vaga das Américas é dos EUA, a não ser que o Brasil ofereça um desafio, o que já aconteceu em 2009 e 2010, quando o capitão brasileiro era Marcelo Melo, que formou um time com seus amigos brasileiros de Quebec – Celso Kossaka, Luis Augusto Silva e Carlos Filipe Nunes. Os norte-americanos venceram fácil nas duas vezes.
Agora o projeto promete ter continuidade e, para isso, o Brasil chegou a propor mudanças no critério de classificação para o Mundial. No início do mês, levou ao congresso da WCF (Federação Internacional de Curling), a proposta de uma repescagem envolvendo o segundo das Américas (o Brasil, por falta de outro), um europeu e um asiático. “Vai para o Mundial o campeão da segunda divisão da Europa, mas o Brasil só vai se vencer os EUA”, argumenta Monticello. A ideia não foi aceita, neste primeiro momento.
A equipe do Desafio será escolhida a partir de uma seletiva, que a CBDG vai organizar entre 12 e 19 de outubro, em Vancouver. Ali são a esperadas as presenças dos atletas da cidade, que treinam juntos regularmente, Marcelo Mello e Filipe Nunes (entre outros atletas de Quebec), um canadense que mora em São Paulo e é casado com uma brasileira e um brasileiro que joga curling na Suíça. Nenhum dos dois nunca foi visto jogando pelos demais. Caso demonstrem o talento esperado, devem compor um time de cinco atletas (quatro titulares e um “alternate”).
Do futebol ao gelo
Goleiro do juvenil do Ceará quando garoto, Monticello, um analista de sistemas cearense de 31 anos, trocou o Brasil pelo Canadá em 2011. Um ano antes, viu os Jogos Olímpicos de Vancouver pela TV e decidiu que, quando seu processo de migração fosse concluído, a primeira coisa que faria seria bater na porta de um clube de curling. Ex-jogador de xadrez, via semelhanças nas duas modalidades.
De 2011 até o fim do ano passado, acreditou que era o único jogador brasileiro de curling em Vancouver. Quando uma grande comunidade de brasileiros no Canadá surgiu no Facebook, perguntou se alguém mais ali praticava a modalidade. Aos poucos, os jogadores foram chegando. Logo estava montada a ABCurling. Mais do que isso: descobriu-se que, como a CBDG (Confederação Brasileira de Desportos no Gelo) é filiada à WCF, o Brasil teria direito a disputar o Mundial de Duplas Mistas, que aconteceu em abril, na Escócia.
O que até fevereiro era quase uma brincadeira foi se tornando coisa séria. Marcelo Mello, hoje comentarista dos canais SporTV, foi escolhido para jogar o Mundial ao lado de Aline Gonçalves, uma bibliotecária, casada com um canadense e moradora do extremo norte do Canadá. Raphael ficou como reserva ao lado de Alessandra Regina, dona de casa em Vancouver. O Brasil venceu um jogo, sobre o Cazaquistão, e perdeu outros sete, terminando em último.
Para “não perder a motivação”, ao fim da temporada, ainda foi disputada a primeira Copa Brasil de Curling, em Vancouver, claro. A organização de Raphael é tanta que foi criado até um tópico na Wikipedia com todos os resultados da competição, vencida por ele e Alessandra. Em segundo, Isis Oliveira e Marcio Rodrigues – ela foi assistente de direção na versão mais recentes de Planeta dos Macacos, por exemplo. Com os resultados em mãos, em teoria as três primeiras duplas podem requisitar o Bolsa Atleta, do governo federal, a partir do ano que vem.
No feminino, o Brasil chegou a pensar em desafiar os EUA, mas a decisão foi concentrar os esforços nos homens. Elas, porém, já têm um técnico estrangeiro, Craig Lightbody, que terá seus custos pagos pela CBDG. O canadense já treinou, entre outras equipes, a seleção de Taiwan, exemplo para o Brasil. Afinal, os asiáticos disputam o Mundial com um time formado apenas por canadenses de ascendência taiwanesa.